22 de novembro de 2009

O estranho edifício

Num dado momento se lembrou do lugar onde cresceu. Haviam muitas coisas que nunca entendeu pra que funcionavam. Sobretudo, em situações que se relacionavam a lugares. Observava determinadas construções que simplesmente não sabia o que tinham. Orgãos estaduais, almoxarifados, escritórios, depósitos. Pessoas que andavam nas ruas e que tinham algo a dizer, ainda que besteira, um lugar de fronteira, com uma linha bem demarcada. Mas os prédios continuavam lá.

Um desses prédios tinha no topo uma rachadura, ou melhor, na parte do canto era um buraco, na aresta. Diziam-lhe que tinha sido um raio, e ele gostaria muito de olhar aquilo de perto. Um fenômeno da natureza, aquilo lhe atraía. Ainda mais um raio. Seu pai conhecia as pessoas que trabalhavam lá. Trabalhavam não, não faziam nada! Todas as tardes eles vinham, se revezando, e conversavam a tarde toda, os mais diversos assuntos e interesses, fosse política, futebol ou religião.

O prédio era branco, com janelas pequenas, basculares. Parecia que não tinha paredes, internas. De fato não tinha. Havia uma entrada central, a direita um guichê, atrás desse mesas com coisas, cadeiras decadentes, um rádio que tocava. A esquerda uma porta maior, que servia para carga e descarga. Conhecia aquele universo de cor, salteado, ao contrário e ao inverso. O cheiro de mofo e papel velho era intenso. Por mais que lhe dissessem o que havia lá, nunca se convencia. Queria entrar lá, ver de fato o que tinha lá.

Não se lembra quando exatamente, finalmente entrou. Os funcionários do lugar nunca compreenderam ao certo o que aquele menino queria tanto saber que tinha lá dentro. Claro, eles nunca cresceram com um prédio daquele na frente de casa e nunca foram curiosos. O lugar onde pessoas estranhas vinham todos os dias com coisas mais estranhas ainda, embrulhadas quase sempre levavam e sumiam. Mas, um deles, cansado daqueles apelos incessantes, aceitou levá-lo até o alto. A construção era enorme, quadrada, de 4 andares. Passou pela grande porta a esquerda da entrada. Ela se abriu e ele sorriu. Parecia entrar em um lugar proibido e que a maioria das outras pessoas sequer sabiam o que existia. Viu enormes embrulhos redondos, altos, como bobinas de papel para alguma máquina. O funcionário que lhe acompanhava lhe dizia o tempo todo que não havia ali nada para ser olhado. Mas ele não acreditava em uma só palavra. Viu uma rampa, e subiu. Começou a correr, crente que havia ali algo mais a ser observado, além de bobinas de papel.