14 de maio de 2015

Causo no Caribe

Depois de descansar a alma e cansar o fígado numa temporada em Cuba estava eu sentado no saguão de embarque do aeroporto de Havana, esperando um vôo para as Ilhas Cayman, pequeno paraíso propriedade da Inglaterra no mar do Caribe onde eu trabalhava.

A espera era rápida, e eu não bebia, comia, lia ou ouvia música com o fone de ouvido para não me distrair, afinal sentia grande prazer em estar sentado naquele lugar. Degustava com calma a dança do movimento das pessoas, inventava explicações, pensava nas possibilidades daquelas vidas, como que pra suavizar a resignação da volta e também pra dizer um emocionado "até breve" pra fantástica Cuba, lugar pelo qual me tornei absolutamente fascinado - uma sociedade simples, com alguma falta material, culpa talvez da pequena produção industrial mas principalmente do absurdo bloqueio dos Estados Unidos da Guerra mas um povo metido às artes, à música e à boemia, transbordando felicidade e pulsando vida, com feições sadias, espanhol bonito, entusiasmo invencível, cultura incrível e absoluta educação.

Bem, lembro que, coincidência ou não, também olhava pra todas aquelas pessoas e viajava nas coisas da computação, pensava que um rosto é antes de tudo um identificador único, um desenho que como todas as imagens guarda informações, que são interpretadas por quem vê e relacionadas a pessoas, nomes, etc, submetidas a uma análise sofisticada que aceita aproximações pra relacionar com as pessoas que conhecemos. Recordo que pensava que, mesmo sem me dar conta, meu cérebro estava lendo, interpretando, armazenando dados e buscando informações de todos aqueles rostos que estava vendo em minha memória, sem certamente encontrar alguma correspondência, afinal não tinha chance de conhecer alguém por lá.

Neste momento uma moça olha pra mim, eu olho pra ela. Ela vira o rosto, eu viro também. Ela olha de novo, eu olho de novo. Ela franzi as sobrancelhas, eu também. Ela olha estranho e fixamente, eu olho estranho e fixamente. Eu balbucio algo, ela também. Ela diz "Linux?" e eu "Marjorie?". Era inacreditável.

Comentei com ela a viagem dos rostos e identificadores, ela provável que se lembrou que eu era o mesmo nerd da computação esquerdista de antes.

Voamos juntos pelo mar verde/azulado do Caribe em direção às Ilhas Cayman, eles na poltrona de trás, nós fechando o pau de falar português no avião daqueles ingleses caribenhos. Descemos e segui meu caminho pra fazer as chatices computacionais que tinha ido fazer no paraíso, eles continuaram as férias, seguindo pra Jamaica.

Ficou a foto. E é claro, o "causo".

Um grande abraço Marjorie!