31 de maio de 2009

Piadela

Aposto que era um gracejo, pois ele afinal não era religioso, tampouco místico ou supersticioso, e obviamente sentia-se superior por isso, feito todos os céticos, os universitários inglesinhos, os modernosos e os vanguardistas, que estão na camada acima das crendices populares, dos ditados, dos chás de ervas pro figueiredo e do horóscopo.

Então, logo depois de descarregar as coisas, acendeu um cigarro e foi encontrar um grupo de conhecidos, e tão logo quanto ganhou a luz fez tom de solenidade, ajoelhou-se, calculou de prévia mais ou menos o que iria dizer em segunda pessoa pra não tropeçar nas conjugações, empostou a voz e levantou os braços:

- Ó deus, tu que és piadista, rancoroso e vingativo, que tens poder criador e matador sobre a terra, que tens controle sobre essa nossa colônia de formigas, que brinca de dilúvio, que tens o fogo nas mãos, espada branca e canela fina, que tens enorme barba e entendes tudo de biologia, de Hegel, matemática e filosofia moderna, ouça minhas humildes e rústicas preces, que imploram vossa autorização pra que eu me divirta uma noite só, só essa, só hoje. Uma.
Autorizo-vos a cobrir com as trevas que vos dá tanto divertimento todos os próximos dias da minha vida depois dessa noite de prazer.

Depois concluiu, só de sacanagem, com "juro por deus."

Meia hora foi o tempo de demorou pro primeiro trovão, e sem nenhum exagero, choveu de enroscar carro e entortar guarda-chuva por seis dias, sem qualquer intervalo.

Cada classe de coisas que havia, pouco ou muito, molhou; bolo de cenoura, cabelos de Bowie, organizadores, roupas, cabos e mesas de som, decorativos e romances, e como não estavam na década de 70 o festival acabou tendo que ser cancelado.

2 comentários: